11.4.08

dias de cinema




É coisa das mais curiosas assistir à ficção O Banheiro do Papa, de César Charlone e Enrique Fernandez, seguido do documentário Juízo, de Maria Augusta Ramos.

Porque ambos lançam um olhar sobre seres humanos pouco favorecidos por condições sociais de maneiras que não podiam ser mais díspares e, quem sabe, mais complementares.

Em Banheiro, temos moradores pobres de uma pequena cidade na fronteira entre Brasil e Uruguai projetando uma redentora esperança para a miséria material de suas vidas em uma visita do Papa que, especula-se, trará centenas de milhares de turistas ao lugarejo.

É fácil se relacionar com essa quase compulsão em crer numa espécie de milagre ilusório, um deus ex machina que nos resolverá os problemas (financeiros?) da existência. E existe a competência do casal de protagonistas, como intérpretes.

Mas as relações entre os personagens, suas vidas íntimas e, principalmente, a organização dramática dos conflitos - a maneira mesmo como o roteiro dispõe seus dramas e suas viradas - pesam a mão, soam pouco verdadeiros em sua integridade emocional, dão aquela estranha sensação do de fora pra dentro.

Longe de dizer que essa é a idéia pré-estabelecida e maquiavélica dos realizadores (como parece acontecer no tão famigerado Babel, por exemplo), é fato que a noção de um “determinismo” não escapa. Pós-clímax, quando planos bastante didáticos reiteram o triunfo da desesperança e o fracasso circunstancial dos personagens, dizendo com todas as tintas que é difícil haver saída do lugar onde a vida nos pôs, cenas inteiras, em pensamento retroativo, ecoam ainda mais uma arquitetura narrativa que expõe em demasia seu esqueleto, priorizando efeitos em lugar de debruçar-se sobre sua essência.

São escolhas narrativas feitas - e arriscadas. Para esse blog, expõe-se mirando algo e chegando em outro lugar. Mas é sabido que funcionam, para muita gente.

Por seu lado, na demonstração de uma realidade (ou, lembrando o velho adágio, do quanto pode sobreviver dela defronte de câmeras "documentais”), Juízo consegue ser certeiro com bem pouco.

Entre depoimentos judiciais acerca de roubos, agressões, homicídios e outros atos, basta uma pequena frase aqui e ali para contemplar uma dimensão gigantesca do quão exasperante e desesperançada uma vida (pobre?) pode ser. E, ainda que às vezes estejamos diante da literal reconstrução fictícia do real, com agudeza e verdade de parâmetros imensuráveis.






Quando A Família Savage tem Laura Linney no melhor de sua forma, as escorregadas passam a ser desculpáveis e você pode crer-se diante de um filme bom (aquele bom na média, satisfatório, que tem seus prazeres). A trama desgasta-se quando busca a “redenção do herói”, mas oferece suas doses de sinceridade emocional e algum humor competente pelo caminho.





Irina Palm é filme um bom tanto paradoxal. Porque vale-se de um ponto de partida dos mais inusitados e diferentes para desenvolver um roteiro que faz algumas das escolhas mais óbvias disponíveis – e simplesmente insuportáveis.

Há, novamente, algum humor urdido com competência e Marianne Faithful (desde 2006, a mãe de Maria Antonieta) consegue na apatia de sua personagem o carisma (mais paradoxo?) necessário para tornar-se interessante.

De novo, é filme que se vê sem prejuízos e com seguro envolvimento. Que tem o mérito, conforme bem ressaltou Inácio Araújo, de driblar o sentimentalismo que poderia assolá-lo, caso a direção resolvesse apiedar-se de seus personagens. Mas que nem por isso deixa de dar aos seres humanos na tela um desenrolar de conflitos dos mais batidos e pouco críveis que se poderia esperar.





E como nem só de filme de boa reputação move-se o moinho de um cinéfilo, Awake – A Vida Por Um Fio é ótimo em sua ruindade de doer. Sua maior estultice é estabelecer uma premissa naturalmente instigante, mas que serve de trampolim para a trama e mingua com progressão assustadora, chegando ao final completamente esvaziada, na medida que os acontecimentos passam a depender pouco ou nada dela (né, Daniel?).

Mas Lena Olin está lá, na ativa como você não lembrava que ela podia estar (né, Marco?) e trazendo algum interesse extra pra patacoada toda. É dela a virada inesperadamente interessante e com alguma emoção da história.




PS
Já, já, Wong e seu Beijo Roubado vão ganhar um post só deles.

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