30.6.10

a estrela brilhante


Ela costura, ele escreve.

Ela, o mundo concreto do tato, da precisão do ponto, da obra útil e com valores comerciais.
Ele, o universo abstrato da poesia, a absoluta imaterialidade, a pretensão em alcançar o sublime.

De um para o outro, o mistério, o intangível e a complexa atração instintiva que escapa à sensatez prática e ao intelectualismo estético. O insondável encontro.

Nas imagens enxergadas e (re)produzidas com depuração, nos corpos de Abbie Cornish e Ben Whishaw, a própria invenção do sentimento romântico, tornado Romântico.

No amor entre Fanny Brawne e John Keats, a formulação de uma tese, um experimento científico de (auto)observação sobre algo que nada tem de cartesiano.

Nos sentimentos do espírito, respostas e reflexos do corpo. E no entendimento das sensações físicas, o intelecto conscientizando um desenho que o resguarde, a estratificação de um molde.

Naquele casal de amantes, acontecendo aquilo que chamavam amor no momento mesmo em que a literatura inventava isso que chamamos amor. Sentir encaixar num pré-conceito as vivências que buscamos tais quais aprendidas em arquétipos. A fabricação dos arquétipos, enfim.

Nos labirintos dos desenhos poéticos, a apreensão de uma fôrma precisa como o corte de um vestido.

Na captura de borboletas, entre palavras ao vento, dentro do fascínio da natureza florida ou nevada, diante do doce voar de uma cortina, atrás de paredes de madeira, sob o olhar infantil ou tomados pelo mais genuíno e primário espírito lúdico daquilo que é mesmo um jogo. Na hipérbole da falta, a metonímia dos gestos.

Nas cartas, nas visitas, na dança, no cerimonial da sala de chá, nas viagens, na doença e na morte, o derramamento e a amplificação das dores e delícias, o extravasamento agigantado dos sentidos que carecem de explosão para saberem-se vivos. O sagrado nos afetos do coração.

Um filme Romântico, enfim, sobre um Romantismo que é matéria prima e produto final, realizado com astúcia, perícia, a delicadeza da grande arte e um senso equilibrado de sentimentalidade e rigor estético.

Salve Jane Campion.

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