30.3.05

CINEMATOGRÁFICAS 5

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"Herói" é vítima de suas próprias qualidades.

Porque é um assombro visual. Porque a direção de arte e a direção de fotografia e as coreografias de luta e os efeitos visuais que as possibilitam são estupendos.

Porque é mesmerizante, sim, quase todo o tempo.

E por isso mesmo acaba esvaziando-se, e bastando-se em si. Não há uma trama que solidifique e amalgame tanta beleza. Longe de ser um belo gratuito e somente artificioso, acaba por ser um belo espetacularizante.

É bom, mas a sensação é a de falta. Ou excesso.

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"Jogo Subterrâneo" soterra uma premissa interessante e deixa espalhadas pelo caminho algumas boas idéias.

Apesar da sempre insuspeita Maria Luisa Mendonça, a trama gira em falso, os personagens giram em falso. E o que poderia ser proposta - e que pode até ter sido - resulta com a aparência de malogro.

Fica uma frustração. Porque o espectador torce pelo filme, quer que ele dê certo. Mas não dá. E o que existe de bom pode até saltar aos olhos, na boa vontade da torcida.

Mas poderia ter sido um grande filme.

21.3.05

CINEMATOGRÁFICAS 4

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“Hora de Voltar” é o que há de simples, sensível e sutilmente criativo no cinema independente norte-americano.

Mesmo o sentimentalismo um pouco mais exacerbado no final acaba adequando-se à proposta. Vale.

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Dakota Fanning é espantosa. Mas “O Amigo Oculto” é ruim.

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“Robôs” tem visual mesmerizante, piadas boas, premissa interessante. Mas não é um “Procurando Nemo”. Nem mesmo é um “Vida de Inseto”. Diverte.

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“Desde que Otar Partiu”, enquanto está sendo projetado, deixa um pouco a impressão de que uma boa idéia está sendo estendida até quase o ponto do desgaste. Quando acaba, no entanto, especialmente nas horas e dias subseqüentes, a impressão que fica é a de que se viu de fato a um bom filme.

Construído com perseverança, fica. E é belo.

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“Confidências Muito Íntimas” não é Patrice Leconte evoluindo. O filme é interessante. Há um bom ator em um bom papel. Ambienta-se a trama quase que inteira dentro de um escritório – o que é feito com dinamismo narrativo louvável. Mas não sobra muito, não fica muito, não se apresenta muito.

“A Viúva de Saint Pierre” e “A Mulher e o Atirador de Facas” eram melhores. Mas não é que esse “Confidências” faça feio. Somente não empolga tanto assim.

13.3.05

ATENÇÃO

“Feminices”, mais um delicioso, profundo e leve filme de Domingos Oliveira, foi sabotado pelo Espaço Unibanco de Cinema. Depois de apenas 1 semana (!!!) em cartaz foi jogado para o limbo da sala 5.

Quem quiser ver “Feminices”, corra.

E fica aqui um grito de revolta. Quem acha que não se fazem filmes fáceis, com bom potencial de público, no cinema brasileiro, pergunte aos exibidores porque eles os tiram de cartaz com tamanha pressa, quando são feitos?!

A “Feminices”, no entanto, voltaremos depois.

Com açúcar e muito afeto

A música de Teresa Cristina é uma evocação à alegria. No palco, ela é um misto de (falsa) timidez – de quem por tanto tempo escondeu tanto talento em uma profissão de manicure - e humildade – de quem parece o tempo todo afirmar intimamente que canta coisas muito maiores que si mesma.

Teresa Cristina esbanja vida. Possui o sorriso e a leveza de alma de uma garota de 15 anos, entusiasmada com o mundo. Vê-la e ouvi-la é flutuar num mundo onde a dor não tem razão.

A voz de Teresa Cristina encontrou seu lugar no samba.

A música de Monica Salmaso é uma evocação ao espírito. No palco, ela emite sons capazes de alcançar o escondido, o sobre-real. Sua voz acalanta a alma, coloca o mundo no místico, instiga e inebria.

A voz de Monica Salmaso é um dos sons mais bonitos do mundo.

A música de Teresa Cristina e a de Monica Salmaso (e de mais 12 sensacionais músicos) encontraram-se com a de Chico Buarque no palco do SESC Pinheiros nesse final de semana.

Chico Buarque? O que se pode dizer sobre esse homem sem parecer francamente reducionista ou deslavadamente exagerado?

Fato é que 1009 pessoas lotaram o teatro, emocionaram-se, pediram “biz” 3 vezes – no que foram atendidas -, dançaram juntas ao som de Chico Buarque por Teresa Cristina e Monica Salmaso.

Catarses musicais coletivas são piegas? Talvez. Mas são uma delícia. Nada substitui a união dos corpos. Nada.

Salve o SESC!

Salve Mônica Salmaso, Teresa Cristina e Chico Buarque!

Salve a música!

1.3.05

CINEMATOGRÁFICAS 3

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Pobres daqueles que não sabem gostar de Eric Rohmer. Não porque tornam-se, assim, pessoas piores. Mas apenas porque estão perdendo muito. Muito.

Porque Rohmer é capaz de fazer, com quase nada, filmes absolutamente encantatórios e inteligentes e engraçados e comoventes. Porque ele tem um modo específico de narrar, calcadíssimo no diálogo, mas bem longe do que se poderia tomar por “teatralidade” (Afinal, isso existe? O teatro e o cinema não são irmãos inseparáveis?). Porque ele constrói narrativas de uma leveza inimaginável e que fluem lindamente – desde que, fique claro, o cérebro do espectador não tenha sido fritado pela necessidade do que se costuma chamar, na modernidade (modernidade?), de “ritmo”. Ou seja, é preciso capacidade – e vontade – de apreensão.

Sobretudo porque Rohmer é capaz, em um filme como “Um Casamento Perfeito”, em cartaz na cidade, de criar uma personagem fascinante, juntá-la com mais outros dois ou três em uma trama que aparenta absoluta banalidade, caminhar devagar, cena a cena e, no fim, pronto: eis um filme de temática rica e complexa que é também divertido e inteligente. É filme francês sem tédio, sem ranço e sem doer, vê só?!

AVISO
Os CONTOS DAS QUATRO ESTAÇÕES, de Eric Rohmer, voltam em sessões únicas nesse final de semana. No CINESESC, evidente. Simplesmente imperdíveis, todos eles. Mas se for pra eleger um preferido, preste atenção em “Conto de Outono” (se bem que “Conto de Verão”... e “Conto de Inverno”...).


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É de se perguntar o que passa na cabeça de Jean-Pierre Jeunet. Após ganhar o mundo com “O Fabuloso Destino de Amélie Poulain”, ele volta com "Eterno Amor", filme que em tudo recria o anterior. Há os flashbacks, há as apresentações bem-humoradas de personagens, há a voz off onisciente que revela pequenas intimidades curiosas, há os detalhes “fofos”, há a imagem ultra-adulterada em cores, tonalidades e texturas, há a câmera que não pára um só segundo e há Audrey Tatou.

Enfim, Amélie vai à guerra, ou melhor, fica em casa enquanto seu amado vai à guerra. E dá-lhe idas e vindas e idas e vindas no tempo e subtramas com um in-ter-mi-ná-vel requinte de detalhes e excesso narrativo.

É chato.

“Cavalos sempre tem cheiro de cavalos”, já se disse. Não cobremos de Jeunet que ele se reinvente a cada filme, até porque excesso de originalidade é invencionice – não custa a perder o foco. Mas também não somos obrigados a rever os mesmos truques, já que a sensação vai ficando enjoativa. É como ficar tirando a pomba da cartola pra sempre, só que ela muda de cor, de tamanho, etc etc.

(Há quem diga que Kubrick falou sobre o mesmo tema em todos os seus filmes, mas ninguém pode acusá-lo de ter se viciado na forma).

Seria imperdível a conversa entre Jean-Pierre Jeunet e Jorge Furtado. Talentos indiscutíveis, ambos parecem, em seus últimos filmes, encantados demais com os truques que instituíram. O que, invariavelmente, os fazem perder, senão de todo a integridade, ao menos a essência. E, na forma pela forma, já temos os fogos de artifício, a fonte do Ibirapuera e assim vai...