19.1.05

DIGNÍSSIMA GRANDE DAMA

Na primeira vez em que vi Maria Alice Vergueiro ela estava descabelada. Andava de um lado para o outro, à minha direita, vestida em soturno vestido preto – não me lembro se já segurando na mão o copo (com bebida) que ela teria insistentemente consigo na hora e meia seguinte.

Ela estava em cena. Em cena de “No Alvo”, montagem tão arrebatadoramente perturbadora que chacoalharia de forma definitiva os meus 14 anos. Entrei, sentei. Maria Alice, então, em interpretação quase dialética e inevitavelmente brechtiana, disparou um espetacular texto de Thomas Bernhard em um quase-monólogo. Ria, chorava, gritava, arrastava-se no chão.

O que pode levar ao entendimento de que Maria Alice Vergueiro é uma dessas atrizes que levantam poeira, bastante dela, para deixar pouco sobrando quando o anuviado se dissipa e os olhos voltam a enxergar bem. Ledo engano: ela é não só força, mas verdade, muita verdade. Dificilmente se esquece uma grande frase ouvida em sua voz – ou qualquer personagem seu.

Faz 8 anos que eu conheci Maria Alice Vergueiro. De sombra de excelência artística do meu início de adolescência, ela transformou-se em amiga, parceira, colaboradora, companheiríssima. E mais: fonte de inspiração infinda. Porque ir ao cinema com Maria Alice é uma delícia. Ao teatro também. Visitá-la, tomar sorvete, comer pizza – estar com Maria Alice é, quase que obrigatoriamente, dar risada.

E assisti-la é inesquecível. O que dizer então de dirigi-la? Porque todo filme que eu escrevo, eu escrevo para ela. Os que não saem para ela, eram para ter saído. Porque quando ela não pode protagonizar, dá-se um jeito de tê-la, de alguma forma. Porque todos os filmes que eu ainda vou escrever serão pra ela. Porque eu quero que Maria Alice ganhe a Palma de Ouro, o Urso de Ouro, o Leão de Ouro. Oscar não – mediocridade demais para talento tão grande.

Talento? Já não sei. Pulsão vital, força, existência, enfim. Disse um crítico uma vez que Maria Alice Vergueiro não faz teatro, ela é teatro. Eu mais do que acredito: sinto, sei, vi, vejo. Conviver com ela é aprender, é divertir-se, é ter idéias, na seriedade e na mais absoluta brincadeira, da qual ela é capaz como ninguém. Maria Alice é exemplo vivo de alguém que sempre acreditou no que acreditava, que sempre buscou o que buscava e que pagou os preços e viveu as glórias de ser fiel a si mesma.

Em meu trajeto de espectador a encenador, o trabalho do ator sempre me exerceu fascínio gigantesco. Por isso, de longe, sempre acreditei, respeitei e valorizei esse trabalho. De perto, em tempos mais recentes, tornou-se mola propulsora de minha transpiração criadora, fagulha de inspiração. Respiração. Ver Maria, no auge de sua maturidade, não se encastelando em prestígio adquirido, como certas figuras mumificadas que há, nem cedendo aos truques e fórmulas consagradas, mas sim se atirando no risco, apreciando o estudo e a investigação constantes e buscando o novo com uma sede de iniciante, inclusive aliando-se, para isso, a novatos como eu, é fato que só reafirma minha convicção nessas pessoas especiais que são os atores.

Maria Alice, essa é uma declaração de amor. E de respeito, e de carinho, e de admiração. Que eu já fiz em filme, em palavra, em texto e vou continuar fazendo. Enquanto houver negativo, palco, papel, força e energia criativa. Ou seja, sempre.

Feliz aniversário!

Rafael.

Um comentário:

paula manzo disse...

pelo que já vi e ouvi, pela admiração tão igual a sua rafa, assino embaixo.
feliz aniversário a grande dama.

e me liga bastardo!!!!, vamos ver a cleide yáconis

bj
(nos dois)