25.1.05

SOBRE O ASSOMBRO DE SER CATE BLANCHET

Cate Blanchett pareia, hoje, em talento, competência, inteligência e dignidade artística com somente duas outras atrizes, considerando sua geração: Emily Watson e Julianne Moore. No Brasil, com Maria Luisa Mendonça.

Em 1997, Cate Blanchett apareceu discretamente para o mundo em dois filmes, “Um Canto de Esperança”, de Bruce Beresford, e “Oscar e Lucinda”, de Gillian Armstrong. Já estavam lá sua visceralidade e seu comedimento, de acordo com o que a cena pedisse. Seu recato e sua extravagância. Seu charme, sua classe, sua beleza. Sua impetuosidade.

Mas 1998 projetaria Blanchett como um cometa, em “Elizabeth”, de Shekhar Kapur. Ela é a alma do filme, capaz de comover com um piscar de olhos, uma inflexão de voz. Sua rainha Elizabeth digladiava-se entre o poder e a fraqueza - e os espectadores absortos em tanta verdade.

“Alto Controle”, de Mike Newell, seria a escorregada de 1999, mas sem perder a compostura. Somariam-se dois belos momentos. “Um Marido Ideal”, de Oliver Parker, é uma das mais subestimadas adaptações de Oscar Wilde para o cinema. Tudo ali funciona perfeitamente, o tempo cômico é preciso e o elenco, chave para o sucesso de um grande texto, bem... o elenco tinha Cate Blanchett, trabalhando, lado a lado com, quem diria, Julianne Moore. E dá-lhe a veia cômica de Blanchett tinindo! Num outro registro, foi necessária pouco mais de uma cena para que ela parasse “O Talentoso Ripley”, de Anthony Minghella.

Em 2000, “Porque Choram os Homens”, de Sally Potter, foi filme que ninguém viu, incluindo o resenhista. “O Dom da Premonição”, de Sam Raimi, é filme ruim que sem a dignidade que Blanchett traz seria pura porcaria. Como em muitos casos, vale por ela.

2001 foi ano cheio. “Vida Bandida”, de Barry Levinson, trazia Cate em seu esplendor cômico. É thriller esperto, divertidíssimo e muito bem humorado. Há, aqui, Billy Bob Thornton, ator que, como Blanchett, não se cansa de ser bom. E, se sozinha ela já faz estrago, o que dizer de quando encontra alguém a altura. A primeira parte da trilogia “Senhor dos Anéis”, de Peter Jackson, assim como as duas seguintes, são notas de rodapé na carreira da atriz – já que ela fez pouco mais que uma figuração de luxo.

“Charlotte Gray”, de Gillian Armstrong, é reencontro de Blanchett com a diretora que a impulsionara com “Oscar e Lucinda”, mas também é filme pouco inspirado. Uma vez mais, havia Cate, sempre ela. E, por fim, em “Chegadas e Partidas”, de Lasse Halström, mais notório desperdício de grande elenco em filme medíocre (havia, além de Blanchett, Kevin Spacey, Judi Dench e... Julianne Moore.), não houve mais do que uma pequena participação no começo da trama. Nesse caso, melhor para ela.

“Paraíso”, de Tom Tykwer, de 2002, é, até o presente momento, cume de uma atriz brilhante. Em momento literalmente metafísico, Cate Blanchett enfeitiça de maneira avassaladora – é verdade demais para tela de menos. Toda vez que se achar que fulano X teve uma atuação excepcional porque fazia com perfeição um homem paraplégico com paralisia cerebral que se comunicava por meio de batuques de colheres metálicas controladas por sua narina direita, pare a projeção e venha a “Paraíso”. Especificamente à cena em que Blanchett vai percebendo aos poucos, em interrogatório na prisão, que matara quatro inocentes. É consumado o assombro. Há a necessidade de oxigênio adicional para a falta de ar do espectador. No mais, “Paraíso” é grande roteiro de Krzysztof Kieslowski e filme de múltiplas leituras e sensações. Uma grande obra.

Depois de tanto, em 2003 Blanchett fez escolhas erradas e protagonizou filmes de mau diretores, onde, com esforço, emergia da bobagem em que se metera. “Desaparecidas”, de Ron Howard, e “O Custo da Coragem”, de Joel Schumacher, não davam chance de grandes momentos, nem sequer de bons personagens.

Tudo isso porque Cate Blanchett está por ser vista, em terras paulistanas, em dois filmes. “Sobre Cafés e Cigarros”, de Jim Jarmusch, e “O Aviador”, de Martin Scorsese. O primeiro, já em cartaz, é uma reunião de curtas, e ela protagoniza um deles, contracenando, veja só, com si mesma. Já no segundo, chegando em breve, ela interpreta Katherine Hepburn. Já é bom antes de se ver. Mas há de ser visto. E, por tais ocasiões, provavelmente, a Cate Blanchett voltaremos mais tarde.

Um comentário:

paula manzo disse...

rafa, vc já pensou em escrever pra alguma revista?

deveria.