3.2.06

uma dupla

Nesses últimos meses, filmes têm chegado a nós em associações. “Marcas da Violência”, estreado em novembro, e “Caché”, exibido na 29ª Mostra Internacional de Cinema de São Paulo, por exemplo, rondam o mesmo assunto e abordam questões semelhantes em histórias e formatos desafiadoramente distintos.

Nesse melhor estilo pares, “Impulsividade”, de Mike Mills, e “O Sol de Cada Manhã”, de Gore Verbinski, versam, como tantos antes deles, sobre o indivíduo (norte-americano) esmagado pela feroz filosofia (primordialmente norte-americana) do sucesso a qualquer preço.

Essa moral formadora do american way of life é matéria antiga na produção dramatúrgica do país, tendo atingido um de seus ápices, em reconhecimento e prestígio, com a peça “A Morte do Caixeiro Viajante”, de Arthur Miller – escrita lá se vai mais de meio século.

Para causar impacto nessa seara, portanto, acaba-se tendo que reciclar muito bem velhos temas, arejando-os, ou usar de forma excepcionalmente competente as fórmulas consagradas.

Nenhum desses dois filmes recentes logra nenhuma das alternativas. “Impulsividade” , acumulando caminhos perigosamente gastos, caminha sobre o terreno pedregoso do filme independente americano, confirmando o que já se espera dele em estética e linguagem – é por demais curioso como a maioria dos filmes aptos a levarem esse rótulo são, quase sempre, admiravelmente parecidos, como se a tentativa de ser novo ou moderno houvesse envelhecido rápido demais e criado um novo clichê.

É palatável, sem dúvida, mas também volátil e esquecível de imediato.

“O Sol de Cada Manhã”, por sua vez, traz Gore Verbinski, que mostrara-se bastante competente no gênero filme de aventura, com “Piratas do Caribe”, para o registro do drama mais intimista. Há um bom elenco, onde até mesmo Nicolas Cage não faz tanta força para ser bom e, por isso, fica melhor. E há uma história bem contada, que possui o grande mérito dramático de abordar o fracasso subjetivo de seu protagonista.

Em lugar de subúrbios de grandes cidades e vidas financeiramente periclitantes, estamos, aqui, numa agitada Chicago, com um personagem dono de um emprego para muitos invejável. O fracasso, desse modo, por não estar no terreno material, deixa de ser objetivo e passa a ser relativizável. Baseia-se na incapacidade de realização individual, do malogro em alcançar e manter posições internamente significativas, em todos os âmbitos. Assistimos, portanto, ao momento de efetiva nudez do rei, embora os olhares que o cercam tenham motivos de sobra para enxergar nele roupas suntuosas. Os conceitos de felicidade e sucesso, aqui, são descascados.

É pena que o filme não aposte por completo nas boas idéias que tem. O que poderia ser uma obra afiada e contundente esvai-se em redenção agridoce. Para quem promete muito, fica a falta.

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