23.10.07

diário da Mostra - dia 1

19/10 – sexta-feira
(cotações de * a *****)


A Ilha (Ostrov), de Pavel Lounguine
RÚSSIA
*
As referências eram As Bodas, filme do diretor que esteve em cartaz nos cinemas brasileiros lá para os idos de 2001 e que era bom, até onde a memória deixa saber. Mas este A Ilha mostrou-se de cara aborrecido e desinteressante. Tudo parecia sério e solene demais. Dormi. Quando acordei, o filme era uma comédia (sombria, mas uma comédia). Duas cenas depois, voltou a ser um drama versando sobre amargura e perdão. Mas de forma mais do que aborrecida.

Fay Grim, de Hal Hartley
EUA/ ALEMANHA/ FRANÇA
* * *1/2
Quando um filme começa com a prosaica cena de uma mãe sendo chamada à escola do filho para uma advertência, em uma pequena cidade dos EUA, e termina em uma conspiração terrorista internacional na Turquia, é fácil reconhecer que se está diante de uma obra de Hal Hartley, cineasta não muito afeito à convenção. Parker Posey domina a cena nos diálogos rápidos, afiados e engraçadíssimos do primeiro ato. O filme pousa na França e sua trama se multiplica em vários personagens e conspirações, ainda mantendo um saudável tom de comedia amalucada, no segundo. No terceiro, por mais que as brechas do nonsense fiquem abertas, uma inadvertida seriedade toma conta da história. Tudo acaba um pouco desconjuntado – ou perfeitamente dentro de contexto, num filme que não se limita ao “normal”.




Não Toque no Machado (Ne Touchez Pas La Hache), de Jacques Rivette
FRANÇA/ ITÁLIA
* * * *1/2
Adaptando Balzac, Rivette faz exatamente aquilo contra o que o cineasta Peter Greenaway vem bradando em anos recentes: um “texto ilustrado”. Mas o faz brilhantemente. Dois personagens, defendidos por dois grandes atores, travam um desnorteante jogo de poder em uma relação amorosa – ou, antes, duelam pelo domínio sobre o outro antes mesmo que se estabeleça uma “relação amorosa”,http://www.blogger.com/img/gl.link.gif aos moldes clássicos. Mas que se desenrola de forma tão intensa que pode re-significar, também, o termo “relação amorosa”. E que conduz a platéia entre o deleite e a angústia, dando-a matéria humana de sobra.


PS:
A primeira cena de conflito entre os protagonistas remete imediatamente ao mais belo momento da ópera Manon, de Massenet. Lá, a heroína vinha suplicar ao herói, em retiro religioso, que reacendesse o amor que ele possuía certamente guardado em si, indagando porque o sentimento mudara (“não é mais minha mão, que sua mão aperta, como antigamente?”, “não é mais minha voz, não é mais Manon?”). No filme, é o herói quem, com sua presença, tenta demover a mocinha a entregar-se irremediavelmente ao celibato da religião. Aqui, toda a maravilha da operística cena de Manon.

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