20/10 – sábado
(cotações de * a *****)
O Homem de Londres (A Londoni Férfi), de Bela Taar
HUNGRIA/ FRANÇA/ ALEMANHA
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Depois de achar o filme completamente deslumbrante, de uma precisa, fina e bela arquitetura (espacial e dramática), soube, por amigos, que ele foi ridicularizado no Festival de Cannes, por público e imprensa. Um outro amigo chamou-o de “arrogante”. Refleti, mas não diminuí minha admiração por um filme que me parece de um equilíbrio fenomenal, desdobrando sua narrativa aos poucos, como um sofisticado leque. O espaço cênico capturado por extasiantes planos-sequência vai se revelando progressivamente (começamos em uma espécie de observatório marítimo para aos poucos entender a cidade ao seu entorno e as posições claras que os locais ocupam uns em relação aos outros). A fotografia é capaz de criar jogos de claro-escuro de arrombar as retinas. E o que poderia ser só formalismo vazio vai adquirindo um intrincado e pungente sentido dramático na medida em que a trama vai, ela também, se revelando (e revelando suas ambigüidades e reentrâncias) cena após cena. É fácil entender como um filme desses é capaz de afastar os espectadores. Mas não é nada difícil aceitar e fascinar-se com sua proposta. Porque, no fundo, toda obra de arte é mesmo “arrogante”.
Vocês, os Vivos (Du Levande), de Roy Andersson
SUÉCIA/ ALEMANHA/ FRANÇA/ DINAMARCA/ NORUEGA
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Como se O Homem de Londres já não tivesse sido combustível intelectual e estético para um dia inteiro (ou mais), Roy Andersson leva adiante a proposta que demarcara claramente no impressionante Canções do Segundo Andar e consegue fazer de Vocês, os Vivos, filme do qual já se tinha todas as referências, uma deliciosa surpresa. O tom algo mais grave, soturno, alarmista até, que sua obra anterior possuía é diminuído em favor de uma ambientação que não seria exagerado chamar de “solar”. O humor e a música entram sem pudor no “universo paralelo” que o diretor constrói utilizando-se de uma direção de arte rigorosa e impecável e de uma fotografia calculadamente esmaecida, que enquadra cenários oblíquos sempre de forma a criar algum ponto de fuga diagonal em seus quadros estáticos. Mas não só. A observação “teatral” que se tem da cena, na medida em que o plano é sempre único, longo e geral, deixa os atores como mágicos centrais da irrepreensível mise-en-scène. Vestidos e maquiados de modo a corroborar um mundo de fantasia que é extremamente real, criam, às vezes apenas com silêncios e gestos, cenas trágicas e hilárias, da mais absoluta humanidade. Há ternura e acidez, remetendo, em seu todo, ao Jacques Tati de Playtime (o que não poderia ser um melhor elogio). Trata-se, enfim, de um filme que dá à vida um filtro estético estarrecedor e, sem trai-la, a torna surpreendentemente atraente. O que mais se pode querer do cinema, afinal?
Control, de Anton Corbijn
REINO UNIDO/ EUA
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Cinebiografia de Ian Curtis que começa promissora mas logo cai na vala comum do simplismo dramático - tudo muito bem disfarçado numa embalagem estética pretensamente atraente. Basicamente, o filme não oferece uma chave de envolvimento emotivo com personagens e situações, tampouco os dá vida e compexidade de forma estética (como faz, por exemplo, I’m Not There, a saber). Há quase um maniqueísmo boboca na relação entre o protagonista e sua mulher e impõe-se um distanciamento “cool” entre o filme e seus personagens que me parece, claramente, um tiro no pé. Tudo não demora a ficar chatinho e algo besta. Esse olhar que pode ser lido como “observacional”, onde o gênio precoce e atormentando é mostrado com certa crueza (impressão reforçada pela fotografia em preto-e-branco), é contradito, por exemplo, pelas inserções musicais algo óbvias. É um filme que faz muita gente feliz (especialmente fãs de Ian Curtis/ Joy Division), não há dúvida. Mas que, em sua essência, é um cinema tolo.
23.10.07
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