13.2.08

11 de fevereiro





um filme em quatro dias, que talvez pudessem ter sido três. pessoas que acreditaram, por algum motivo, naquilo que você escreveu. um coletivo que trabalha não para uma pessoa, mas para uma idéia em comum.

porque a gente acredita na ilusão. por que a gente acredita no cinema?

pessoas que trabalham de graça, pessoas que trabalham por muito pouco dinheiro. pessoas que querem, talvez sem saber por que querem, ver a cena acontecer. ver o rolo na lata. ver o filme na tela.

tempo que sobra, tempo que falta. enquadrar e iluminar. ensaiar. atores que se descascam e se entregam a outras pessoas que eles nem conhecem. pessoas que eles inventam.

trabalhar para uma idéia, não para uma pessoa. porque ser diretor é basicamente reger. o contratante pode ser o próprio filme?

uma segunda-feira, último dia de uma filmagem ótima. calor, Santos, pessoas felizes que tomam sorvete. uma chuva que caiu, que deixou a areia molhada, um céu que quer fechar pra virar o melhor céu que um fotógrafo pode querer.

fazer um filme sobre uma pessoa que vai morrer. e que na verdade é você mesmo, disfarçado de personagem, projeção de uma outra pessoa que morreu de verdade. fazer o filme e morrer um pouquinho também? ou fazer o filme para viver?

levar 22 pessoas para filmar em uma praia que tem uma cidade atrás. e um céu nublado na frente. uma chuva que de repente resolve que quer vir e que se transforma em questão literal de minutos em uma tempestade tropical. um mar pacato que fica furioso, um vento que sopra o ar de uma vida inteira.

o tempo que não se vai mais ter, a pressa, 22 pessoas que não se conhecem ou se conhecem ou se conheceram correndo de um lado para o outro para fazer uma cena, embaixo de uma tempestade tropical que ainda não chegou, que chegará em um minuto. o toureiro diante do touro, os instantes antes do abismo. por que é tão importante uma cena que é só de mentirinha?

na areia, uma mãe, uma avó, um amigo querido que veste capa de chuva e está só de passagem. a última areia da ampulheta, a pressa, filmemos sem o cabo do som, filmemos sem ouvir, filmemos mesmo sem ver.

quase no mar, 20 pessoas em volta de dois atores que tem que dizer coisas tristes sob a tempestade, 7 km de praia que se esvaziam, todas as tonalidades do cinza. 11 minutos sem cortar, porque você não deve perder o impulso antes de pular para o outro lado (do abismo). vento, muito vento.

um rolo na lata. uma ameaça que não se cumpre, uma chuva que cai fraca, que pára de cair. o mar que volta à sua tranqüilidade, o vento que não venta mais.

um dia que acaba, uma luz que cai. dois atores que se amam de mentira pra poder dizer coisas tristes. relâmpagos que vêm sem trovões, mas que são ameaçadores o suficiente mesmo mudos.

uma cena refeita, 20 pessoas às voltas com metros de cabos e equipamentos caros. um picolé que vem, outro que vai. “o marco fez uma musica pra mim”, ele diz. “eu tomo conta do mundo pra você”, ela diz. e o marco fez uma música para mim.

sem vergonha em mudar tão rápido de idéia, um céu que abre e clareia. e um sol que inunda arrombando as retinas de quem vê uma praia de 7 km que a tempestade esvaziou. um ator que mergulha no mar, de pijama. uma luz que parece de outro mundo. um arco-íris sobre a baía. 22 pessoas muito felizes e meio tontas. se acreditássemos em forças superiores, poderíamos saber que elas existem.

um filme que acaba. e alguma coisa que aconteceu.

6 comentários:

Unknown disse...

Traduzido em palavras....melhor mesmo só a imagem e estar entre essas 22 pessoas!!! Deixei no mar minhas presses que talvez nem precisasse!!

belribeiro disse...

que lindo!!!!

pm disse...

eu acredito nas forças superiores, nas energias contidas naqueles momentos, e no sucesso desta equipe e dessas latinhas que contém um pedaço de cada um de nós.

Unknown disse...

maravilhoso, ainda mais com essas palavras.... muito especial pra mim ou melhor pra todos com certeza.

Naná disse...

Estou passando aqui para agradecer pelos livros que você me deu no Natal, realmente otimas leituras... Por hora, inacabadas, pois eu estou em uma correria (você deve lembrar como é sair da provincia para a capital, alias, acredito que em breve serei sua vizinha) mas estou adorando!
Espero que esteja tudo correndo bem para você.
Abraços.

the build up disse...

que pensamento de uma imagem linda, momento que aguardo ansioso em ter minha retina invadida por tamanha luz!